25/07/2021

VINGADOR NEGRO - A LÂMINA DA JUSTIÇA - PARTE 2

 5

Na manhã seguinte, o xerife Ray praguejava aos montes sem saber do paradeiro de seu ajudante. Na cabeça inocente de Winston, Brian havia se engraçado com alguma prostituta e se esquecera do bendito dinheiro. Era do feitio de Brian se atrasar por causa de mulheres. De uma coisa Ray tinha certeza, Brian não perderia o dinheiro, porém, a demora perturbava-o. Ele pregara os olhos naquela noite. No meio da madrugada, havia acordado e pensado em ir até a casa de Brian. Entretanto, alguém poderia vê-lo e não seria muito decente encontrar o xerife de Austin às quatro da manhã saindo da casa de seu ajudante. Por isso, mesmo agoniado, Ray esperou.

Mas quando o relógio marcou onze da manhã, Ray chamou um garoto que brincava na frente da delegacia e pediu para que ele fosse chamar Brian. O menino aceitou a tarefa e ganhou dez centavos para executá-la.

Quinze minutos depois, ele voltou suado e com um sorriso no rosto.

– Brian não estava em casa – O garoto relatou.

– Isso não pode ser verdade – Winston agarrou o braço do menino – Você bateu na porta? Gritou pelo nome dele?

O menino assentiu.

– Tem certeza que ele não estava lá, moleque? – A entonação da voz de Ray aumentou.

– Bom dia, xerife Winston!

Assim que ouviu a voz atrás de si, Ray percebeu que apertava o braço do pobre garoto. Esboçando um sorriso sem graça, ele soltou o menino e virou-se para a voz que o cumprimentava.

Dois homens trajando roupas sociais finas e chapéus formidáveis estenderam a mão para cumprimentá-lo. O mais novo era negro com olhos grandes e ombros largos. O outro era pouca coisa mais velho, magro e com pernas longas.

– D. Gabriel, bom dia – este era o magro – D. Vitor, que prazer revê-lo. Que notícias boas trazem para Austin neste belo dia?

– Um grande dia, xerife – bradou Gabriel – Através de uma aposta, ganhei dez vacas e um touro.

– Santo Deus! Que mão de sorte, D. Gabriel!

– Foi sorte de principiante, xerife. Eu disse a ele para não confiar nas cartas, mais cedo ou mais tarde, elas vão traí-lo feito um chacal. Além disso, não confio muito nas mesas de Austin – confessou Vitor.

– Caso desconfie de algum saloon, basta me informar, D. Vitor. Eu não vou tolerar nenhum tipo de crime nesta cidade.

– Esqueça o Vitor, xerife. Ele é uma velha serpente desconfiada. E a sorte ainda não sorriu para ele como as lindas senhoritas no baile da Madre Socorro.

– Pelos mil diabos, Gabriel! Com essa língua peçonhenta vai acabar fazendo o xerife pensar que somos homens sem moral.

– Ora, cavalheiros, estamos entre amigos. E se há uma lista de homens que considero honrados, os senhores estão no topo da lista, com certeza.

– Santas palavras, xerife – disse Gabriel – Isso merece um brinde no saloon.

– Eu sinto ter que recusar, D. Gabriel, mas estou no meio de um problema.

– É o mascarado de novo? – perguntou Vitor.

– Ainda não sei dizer precisamente. Mas estou quase descobrindo – respondeu Winston.

– Ele deve ser um homem amargurado. Teve um dia ruim ou perdeu sua fortuna, aí deve ter perdido a noção da realidade – disse Gabriel – Quem mais se vestiria daquela maneira?

– Talvez eu discorde de você nesse ponto – rebateu Vitor – Acredito que ele saiba muito bem o que está fazendo. Um homem amargurado não planejaria seus passos tão perfeitamente. Além disso, ele parece querer fazer justiça ou ajudá-la a ser feita.

– Pode ser, mas não acredito muito na justiça de foras da lei. Na verdade, não acredito na justiça executada através da violência – relatou Gabriel.

– O senhor é um grande pensador, D. Gabriel – elogiou o xerife – Deus queira que cheguemos a um momento em que não precisamos mais de violência para cumprir a justiça. Torço por isso.

– Mas até lá, não concordam que a justiça precisa de uma mãozinha? – indagou Vitor.

– Uma mãozinha vestindo roupa preta? – brincou Gabriel.

– Não me leve a mal, D. Vitor. Mas já vi muita coisa ruim acontecer quando alguém deseja ajudar a justiça. Talvez esse justiceiro encapuzado tenha boas intenções, mas é muito fácil tornar boas ações em más. Agora, se me dão licença, o dever me chama, cavalheiros. Foi um prazer conversar com os senhores.

Eles se cumprimentaram e Winston entrou em seu escritório.


6

Os três irmãos Barreto entraram no saloon mais famoso e frequentado de Austin, intitulado Águia Esmeralda. Eles já haviam passado por seis outros saloons naquele dia e estavam próximos de encontrar a informação que procuravam.

As mesas do primeiro cômodo estavam ocupadas por muitos clientes. À esquerda, havia mesas de jogos e, à direita, um piano sendo tocado por uma mulher.

Carlos se aproximou do balcão. Atrás dele, havia um grande espelho. O barman – um sujeito com a cabeça careca e enorme – veio rapidamente para atendê-lo.

– O que deseja, senhor?

– Uma informação – disse Carlos.

Sérgio depositou uma nota de dólar no balcão ao mesmo tempo em que a musicista iniciava uma nova canção.

O barman pegou o dinheiro.

– Procuro pelo espadachim mais habilidoso dessa cidade.

– Esse foi o dinheiro mais fácil que consegui – zombou o barman – Quem nunca ouviu falar de D. Dalton?

– E onde podemos encontrá-lo? – perguntou Fernando.

– Provavelmente saindo da missa. Ele nunca perde uma.

Carlos agradeceu e os três saíram do saloon.


7

 D. Dalton era um homem robusto com um rosto quadrado e cabelos curtos. Ele estava acompanhado de sua mãe, na porta da igreja, quando foi abordado pelos irmãos Barreto.

– Você deve ser D. Dalton – disse Carlos.

– Sim – ele respondeu – Em que posso ajudá-los?

– Eu me chamo Carlos Barreto e estes são meus irmãos, Sérgio e Fernando. Estamos aqui para desafiá-lo para um duelo, senhor Dalton. Ou se preferir o termo, viemos aqui desmascará-lo.

– Do que estão falando? – perguntou a mãe de Dalton.

– Estamos quase convictos de que seu filho é o fora da lei mascarado de Austin – revelou Sérgio.

– O quê?! - o tom de voz da velha senhora subiu chamando a atenção das outras pessoas que deixavam a catedral.

– Calma, mãe. Isso só pode ser algum engano – Dalton se voltou para os irmãos Barreto – Me diga, o que te fez chegar a essa conclusão?

– Ora, a simples junção dos fatos. Várias testemunhas afirmam que o mascarado é exímio espadachim. E, segundo os cidadãos desta cidade, o senhor é o melhor espadachim de Austin. Quanta coincidência, não acha?

Incondicionalmente, uma pequena roda de pessoas observava de longe a discussão.

– Pois é isso que esta informação significa – reclamou Dalton – Pura coincidência.

– Então acredito que o senhor não terá problemas em entrar no duelo contra os três irmãos Barreto, não é? – desafiou Carlos – Seja para tirar nossa dúvida, seja para preservar a sua honra.

– Eu não preciso provar nada para vocês – disse Dalton – Vamos, mãe.

Carlos, entretanto, se interpôs no caminho dele.

– Me perdoem a intromissão – um homem vestido de batina preta se aproximou; era o padre Alonso – Não pude deixar de ouvir as acusações que fizeram contra D. Dalton e preciso dizer que não há nada no comportamento dele que desperte algum tipo de ligação com esse fora da lei mascarado.

– Padre, o senhor entende dos caminhos de Deus, mas nós, os irmãos Barreto, já lidamos com homens de todos os tipos. Podemos afirmar que homens acima de qualquer suspeita são aqueles de quem devemos ter todas as suspeitas – refutou Carlos.

– Não desejamos confusão – falou Sérgio – Estamos oferecendo a oportunidade para que D. Dalton se mostre inocente diante de toda cidade. Basta apenas que ele lute conosco.

A informação que os irmãos Barreto estavam omitindo era que eles haviam conversado com algumas pessoas que viram o mascarado lutando. Embora os relatos não fossem tão precisos sobre o estilo de combate, as poucas informações mostravam que o fora da lei tinha um estilo de luta das escolas californianas, ao menos era a conclusão que os irmãos Barreto haviam chegado. Por causa de uma experiência na cidade de San Antônio, Fernando Barreto conhecia a modalidade de combate californiana e pretendia usar esse conhecimento para desmascarar Dalton.

– Eu poderia muito bem acabar com vocês três agora – disse Dalton – Mas isso ainda não provaria nada. Além disso, vocês não são a lei em Austin.

D. Dalton esbarrou no ombro de Carlos e continuou caminhando com sua mãe.

– Esta foi a sua oportunidade, D. Dalton. Não diga depois que nós não oferecemos uma chance.

D. Dalton deu de ombros.

 

8

O sol já estava se despedindo quando os irmãos Barreto usavam a Cachoeira Azul, ao norte de Austin, para tomar banho. Nenhum deles notou uma figura pegando suas roupas e suas armas à beira do rio.

– Tem certeza de que é o Dalton? – indagou Sérgio que se lavava próximo de Carlos.

– Quase – respondeu Carlos – Um filho de rico querendo bancar o justiceiro não seria novidade por essas bandas. A riqueza induziu-os a pensar que a vida é um conto heróico de seus livros.

– Vamos ficar de olho nele – disse Sérgio.

Um pedaço de um monumento quebrado de uma entidade indígena jazia próximo à queda da água. Fernando estava encostado no monumento com olhos fechados aproveitando o vento leve quando sentiu algo gelado tocar seu pescoço. Ele abriu os olhos imediatamente se deparando com o fio de uma lâmina prateada.

– Ei! Boa tarde, cavalheiros! – gritou uma voz chamando a atenção de Carlos e Sérgio.

Um sujeito vestido de preto e usando máscara estava encostado no monumento com uma rapieira apertando o pescoço de Fernando.

– Diabos! – gritou Sérgio – É o cara!

– Desculpe interromper seu banho – disse o mascarado – Mas soube que estavam me procurando.

Carlos ficou paralisado. Só então notou que suas roupas, seu coldre com armas e seu cavalo tinham sumido. Ele se sentiu vulnerável tal qual nunca antes desde que se tornara um homem.

– Que tal conversarmos aqui fora? – O mascarado sorriu – Ou será que preferem ver quanto tempo vai levar para minha lâmina encontrar o outro lado da garganta de seu irmão?

– O que faremos, Carlos? – perguntou Sérgio.

– Maldita raposa… – resmungou Carlos caminhando para fora da água.

O mascarado jogou uma corda nas mãos de Fernando.

– Amarre um laço no seu pé, depois nos pés dos seus irmãos.

Fernando praguejou, mas obedeceu. Enquanto amarrava a corda em volta de seu pé, Carlos e Sérgio se aproximaram.

– Achei que seria mais difícil enganar os irmãos Barreto, mas vocês são tão orgulhosos de si mesmos que se tornaram presas fáceis.

– Você acha que é digno pegar um homem tomando banho? – disse Carlos.

– O que você entende sobre dignidade? Hoje, você acusou um homem bom na saída da igreja e, mesmo diante de tantas pessoas, não se importou de provocá-lo para uma luta contra três. Ou vai me dizer que três contra um é uma luta justa?

Carlos não respondeu. 

– Além disso, irmãos Barreto, eu conheço os métodos infames que vocês empreendem em suas caçadas. Sempre oprimindo pessoas inocentes e coagindo pobres em nomes dos corruptos e poderosos.

Fernando terminou de amarrar o pé de Sérgio e começava a passar a corda pelo pé de Carlos.

– Pois vou dizer o que vocês vão fazer – a voz do mascarado se tornou autoritária – Vocês vão sair da minha cidade. Agora. E isso é bem mais que justiça, isso é misericórdia. E não será oferecida novamente.

Fernando havia concluído sua tarefa.

– Virem-se para a água.

Os três obedeceram. O mascarado desferiu um golpe cirúrgico com a rapieira e desenhou nas costas dos três as letras VN.

– Um presente para se lembrarem do dia em que receberam misericórdia ao invés de justiça. 

Depois de dizer isso, o mascarado deu um chute no traseiro de Sérgio que se desequilibrou e caiu na água levando os irmãos junto.

Carlos tentou voltar à tona, mas com o pé preso ao pé do irmão não conseguiu equilíbrio e assim também foi com os outros.

Quando finalmente eles conseguiram sair da água, não havia mais ninguém na margem e eles tinham outras preocupações como encontrar suas armas e suas roupas. E, de fato, eles acharam suas coisas a um quilômetro e meio de distância, na entrada da cidade, depois de serem vistos nus por inúmeras pessoas.

– Que o diabo o carregue, justiceiro maldito! – praguejou Sérgio.

– O que vamos fazer agora? – indagou Fernando após se vestir.

– Nós nunca fomos humilhados… – Carlos rangeu os dentes – Ele se acha esperto, mas vai descobrir que não deveria ter despertado nossa ira.


CONTINUA...

POR NAÔR WILLIANS

NOVO!

O VINGADOR NEGRO - O MAU RANCHEIRO - 10 de 10 - Final

Na vastidão do rancho de Dom Gabriel, um homem de quase trinta anos com a energia e visão de quem entende a complexidade da vida, a notícia ...