22/09/2025

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 05

O silêncio pesava mais que a floresta inteira. As dez figuras me encaravam, e percebi que o círculo não era apenas de tochas — era um cerco. Não havia saída.

Engoli o medo e forcei a voz a sair firme, ainda que soasse como casca seca quebrando:
— Eu não trouxe Vargas até vocês. Se o nome dele aparece nas pedras, é porque ele já anda entre lendas e homens. Mas saibam: se ele escreveu, é porque queria ser visto. Quem se esconde não grava o próprio nome.A Iara ergueu o queixo, os cabelos se movendo como água agitada:
— Então você o entrega?

Olhei em volta. O Boitatá arqueava o corpo flamejante, como se já se preparasse para queimar cidades. O Mapinguari rosnava baixinho, saliva grossa escorrendo no chão. Cada um queria um sacrifício.

— Eu entrego a verdade — respondi, respirando fundo. — Se Vargas mexe com forças que não entende, ele deve ser julgado. Mas não pelos homens que ele engana... e sim por vocês, que ele afrontou.

O Curupira inclinou-se para a frente, pés marcando lama no chão de raízes:
— Palavras ousadas para quem é apenas passageiro. Você pede que sejamos juízes de nossa própria ruína.

— Sim — retruquei. — Porque se vocês destruírem humanos sem distinção, se virarem fogo e dente contra todos, vão virar só mais um pesadelo. E pesadelos... os homens esquecem.

A sombra de Anhangá moveu-se, os olhos em brasa fixos em mim.
— Ele fala como quem já nos viu sumir dos lábios das crianças.

Matinta Perera soltou um sopro gélido que apagou metade das tochas.
— Talvez Hustler esteja aqui não para ser punido, mas para ser usado.

Nesse momento, o Boto sorriu com um sorriso humano demais, os olhos cintilando.
— Ele pode ser nosso mensageiro. Levar Vargas até nós.

O Curupira ergueu a mão, e todos silenciaram.

— Então está decidido. Hustler, você terá uma chance. Se trouxer Vargas até este círculo, sua vida volta a ser sua. Se falhar... será lembrado apenas como mais um eco entre as árvores.

O chão tremeu, e senti a floresta engolindo o tribunal. Num piscar, estava de volta ao quarto. Billy estava de joelhos diante do quadro, a mão ainda suja de lama.
Ele ergueu o rosto para mim, pálido:
— O que eles disseram?

Do corredor, ecoaram de novo as três batidas secas.

— Que Vargas não é quem diz ser — murmurei. — E que agora... ele é nosso caminho.

CONTINUA...

POR ALCÍ SANTOS

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 04

O ar pareceu se dobrar sobre si mesmo quando os olhos do Curupira se abriram. Antes que Billy pudesse reagir, senti a pressão de mãos invisíveis me arrancando do quarto. Não houve grito. Só o som abafado de raízes se enroscando em volta do meu corpo, puxando-me para dentro da escuridão.

Quando a luz voltou, já não havia paredes. Estava em um círculo aberto no coração da mata, iluminado por tochas que ardiam sem consumir nada. Ao redor, dez figuras me observavam. Nenhuma delas era humana.

Eram as dez maiores lendas da Amazônia, reunidas como um tribunal antigo:

Curupira, de olhos faiscantes e pés virados.

Iara, seus cabelos escorrendo como rio noturno, cantando sem voz.

Boitatá, serpente de fogo, ondulando em espirais de brasas.

Mapinguari, gigante de um só olho e boca no estômago.

Matinta Perera, velha encurvada, o sopro dela trazendo o frio.

Boto cor-de-rosa, com seus olhos humanos demais.

Cobra-Grande, enrolada nos limites do círculo, respirando pesado.

Anhangá, o cervo fantasma de olhos em chamas.

Caboclo d’Água, gotejando no chão seco.

Mãe do Mato, coberta de folhas vivas, que murmuravam como vento.

O Curupira tomou a palavra, voz grave como tronco rompendo:
— Trouxe Hustler para ouvir o que se esqueceu. Há uma decisão a ser feita: destruir quem nos esquece... ou destruir quem nos inventou.

O círculo se moveu em murmúrios. Eu entendi. Não eram só humanos que estavam em julgamento, mas também as próprias lendas que se corromperam, usadas em histórias distorcidas.

Iara inclinou-se, apontando para mim com um dedo de água:
— Eles profanam o rio, cantam meu nome em festas de mentira, e riem.
Boitatá rugiu:
— E ateiam fogo na floresta, como se quisessem me convocar.

Foi então que a Matinta Perera, com sua voz de ferro e areia, se aproximou de mim.

— Há um humano suspeito, Curupira. Ele atravessou a mata com carvão nos bolsos e deixou símbolos na pedra. Um nome ele riscou, repetidas vezes... “Vargas”.

O nome caiu no círculo como pedra no lago. Billy não estava ali, mas eu podia sentir o medo dele dentro de mim.

O Curupira olhou para mim, olhos de fogo refletindo todos os outros.
— Hustler, você os trouxe. Cabe a você decidir: mostrar o culpado... ou pagar por ele.

As tochas arderam mais forte. E ao fundo, no vento, uma batida ritmada ecoou — três toques secos. O mesmo código da parede.

CONTINUA...

POR ALCÍ SANTOS

NOVO!

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 10

Finalmente, ao amanhecer, o enigma se desvendou. Um compartimento secreto na pedra se abriu, revelando não ouro ou joias, mas uma essência l...