05/12/2025

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 10

Finalmente, ao amanhecer, o enigma se desvendou. Um compartimento secreto na pedra se abriu, revelando não ouro ou joias, mas uma essência luminosa que pulsava como o coração da floresta. Hustler estendeu a mão para pegá-la, mas Billy hesitou.
— Espere! As visões... Elas dizem que isso pertence à terra. Nós precisamos devolver, não roubar.
Hustler riu, mas antes que pudesse responder, as lendas se materializaram: espíritos etéreos, formas de folhas e vento, circundando-os. Julgando sua ganância e ousadia, os guardiões decidiram ensinar uma lição eterna. Com um gesto suave, transformaram Hustler e Billy em duas árvores frondosas, suas raízes entrelaçadas no solo fértil da clareira. Agora, eles vigiariam o tesouro para sempre, suas folhas sussurrando histórias aos viajantes que passassem por ali.

ATÉ A PRÓXIMA TEMPORADA !!! 

POR ALCÍ SANTOS 

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 09

À medida que o sol se punha, tingindo o céu de tons alaranjados, os dois amigos avistaram uma clareira iluminada por um brilho etéreo. No centro, erguia-se uma pedra antiga, gravada com símbolos indecifráveis. Hustler sacou o mapa e comparou as marcas.

— Veja só, Billy. Isso é exatamente o que procurávamos.

Agora, precisamos decifrar esses enigmas para revelar o tesouro.

Billy se aproximou, tocando a superfície fria da pedra. Uma visão surgiu em sua mente: imagens de espíritos da floresta, as lendas vivas que vigiavam o equilíbrio da natureza. Ele recuou, assustado.

— Hustler, eu vi coisas... Seres antigos. Eles não vão nos deixar levar nada sem um preço.
Hustler franziu a testa, mas sua ganância a impulsionava.
— Bobagem. Vamos resolver isso juntos. Use sua esperteza, garoto.

Eles passaram horas debatendo os símbolos, unindo peças de quebra-cabeças ancestrais. A noite caiu, e com ela veio uma brisa que parecia sussurrar advertências.

No entanto, a determinação dos dois os mantinha firmes, ignorando os sinais de que as lendas não eram meras histórias.

CONCLUI A SEGUIR... 

POR ALCÍ SANTOS 

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 08

Hustler e Billy caminhavam pela floresta densa, onde as sombras das árvores antigas se entrelaçavam como segredos guardados por séculos. Hustler, com seu chapéu desgastado e um sorriso astuto, liderava o caminho, enquanto Billy, mais jovem e impulsivo, carregava a mochila pesada com suprimentos. Eles buscavam o tesouro lendário, escondido no coração da mata, segundo as antigas histórias contadas pelos aldeões.
— Ei, Hustler, você acha mesmo que esse mapa é verdadeiro? — perguntou Billy, limpando o suor da testa.
Hustler parou por um momento, ajustando os óculos embaçados.
— Claro que é, garoto. Eu não arriscaria nossa pele por uma fábula qualquer. Mas precisamos ser cuidadosos; as lendas falam de guardiões que protegem o lugar.
Eles prosseguiram, desviando de raízes retorcidas e riachos murmurantes. De repente, um ruído ecoou ao longe, como o sussurro do vento carregando vozes ancestrais.

Billy sentiu um arrepio, mas Hustler apenas riu baixinho, incentivando-o a continuar.

A jornada mal havia começado, e o ar estava carregado de mistério. 

 CONTINUA...

POR ALCÍ SANTOS  

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 07

O impacto no asfalto arrancou o ar dos meus pulmões. Por um segundo, tudo o que existia era o zumbido nos ouvidos e o cheiro de poeira e vidro. Billy rolou ao meu lado, gemendo, mas vivo.  

— Hustler... a gente tá morto? — murmurou ele, tentando se levantar.

— Ainda não.

Apoiei a mão no chão frio e forcei o corpo a ficar de pé, mas se a gente ficar parado, aí morreremos mesmo.

Acima de nós, o quarto explodia em clarões azuis que dançavam pelas frestas da janela estilhaçada. A luz do giz do Guardião atravessava o vidro como se fosse papel de seda, riscando o interior com relâmpagos silenciosos.

— Ele vai descer — sussurrou Billy. 

— Cara, ele vai descer. É por isso que a gente vai sumir antes.

Puxei-o pela gola da camisa, arrastando-o para a sombra projetada pelo prédio vizinho.

 — Anda. Mantém a cabeça baixa Billy.

A rua parecia mais longa do que algumas horas antes. O poste de mercúrio piscava, como se também tivesse medo de se manter aceso. Cada janela escura era um olho fechado, recusando-se a testemunhar o que caminhava entre mundos naquela noite.— O que foi aquilo na porta? Billy insistiu, tropeçando no meio-fio.

 — Não era só poder humano, Hustler. Gente não desmancha porta em poeira.— Era humano o suficiente pra usar terno e falar em “propriedade do Estado”. — Apertei o passo. — O resto é o tipo de empréstimo que se paga caro.Virei a esquina sem olhar para trás, mas senti, mais do que ouvi, quando o clarão no quarto cessou. O silêncio que se seguiu não era vazio; era atento. Como se o Guardião tivesse parado para escutar nossos passos na calçada.

— Ele pode nos rastrear? — perguntou Billy.

Se o giz dele funciona como o seu quadro, pode. — Apontei para o casaco de Billy. 

— Cadê o seu giz?

— Quebrei tudo quando terminei o desenho. Você viu.

— Ótimo. Então, por enquanto, só ele tem linha para escrever no ar. Caminhamos em direção à avenida principal, onde a cidade ainda fingia normalidade com letreiros de farmácia e padarias fechadas pela metade. Um ônibus vazio passou, iluminando-nos por dentro como fantasmas por alguns segundos.

— Hustler, e se ele estiver certo? — Billy perguntou, a voz quase sumindo no barulho distante de um motor.

— E se o tribunal da floresta tiver errado em confiar em você?

— O tribunal não confia em ninguém, Billy. Ele negocia.

Olhei para os meus próprios dedos, ainda manchados da lama sagrada que pingara da tela.

— E eu aceitei o contrato. Quem tá em dívida agora sou eu. 

Billy respirou fundo, engolindo as próximas objeções. Sabia que, depois da sentença do Curupira, não havia volta. Ou cumpríamos o prazo, ou virávamos ecos — sombras sem história, andando em círculos na memória da floresta.

— O Arquivo Nacional fica do outro lado da cidade — ele comentou, quase para preencher o silêncio.

— Como a gente chega lá sem ser riscado do mapa por um giz azul assassino?

— Primeiro, a gente precisa de sombra. Depois, de velocidade.

Olhei para o fim da avenida, onde as luzes dos táxis formavam uma linha tremeluzente. O mundo humano continuava funcionando, alheio ao tribunal e ao Guardião. Mas, naquele momento, toda a ordem urbana parecia um véu fino demais para segurar o que vinha do escuro.— E da próxima vez que ele aparecer — completei —, a gente vai estar preparado. Porque se o Estado acha que possui o Vargas, então o Estado tem rastro. E rastro é tudo o que a gente precisa.

 CONTINUA...

 POR ALCÍ SANTOS 

13/11/2025

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 06

O silêncio que se seguiu à batida no corredor foi mais ensurdecedor do que o rugido do Mapinguari. Billy, ainda ajoelhado, parecia uma estátua de sal, os olhos fixos na porta. A lama em sua mão era a única prova física de que o tribunal da floresta não havia sido um delírio febril.

— O que eles disseram? — repetiu Billy, a voz um sussurro rouco.

— Que Vargas não é quem diz ser — murmurei, sentindo o peso da missão se instalar em meus ombros.

 — E que agora... ele é nosso caminho.

A terceira batida, mais forte e impaciente, fez a porta vibrar. Não era a batida de um vizinho, nem de um policial. Era a batida de algo que não precisava de permissão para entrar.

— Billy, levanta. Precisamos sair daqui — ordenei, pegando a mochila que estava jogada no chão.

— Sair para onde, Hustler? Para a floresta? Para entregar um homem a um bando de... de lendas?

— Não são lendas, Billy. São juízes. E eles nos deram um prazo.

A madeira da porta começou a estalar, como se uma pressão invisível estivesse sendo aplicada.

— O que está batendo? — perguntou Billy, o pânico finalmente o libertando da paralisia.
— Não importa. O que importa é que eles não querem que a gente encontre Vargas. E se o tribunal da floresta quer Vargas, e o que está lá fora quer nos impedir, Vargas está no meio de algo muito maior do que imaginávamos. Corri para a janela, abrindo as cortinas pesadas. A rua estava deserta, iluminada apenas pela luz fraca de um poste de mercúrio.

— O Curupira disse que se eu falhar, serei um eco. E se eu tiver sucesso, minha vida volta a ser minha. É a única chance que temos de sair dessa história vivos.

Billy correu até mim, olhando para a porta que agora gemia sob a tensão.

— E como a gente acha o Vargas? Ele sumiu há meses!

— Ele não sumiu. Ele se escondeu. E quem se esconde, Billy, sempre deixa um rastro. O Mapinguari, o Boitatá, a Iara... eles não me deram um mapa, me deram uma pista.

Puxei Billy pela manga, afastando-o da porta que ameaçava ceder.

— O que eles disseram sobre ele?

— Que ele mexe com forças que não entende. E que ele afrontou o tribunal. Pense, Billy. Onde um homem que afronta o mito se esconde? Onde ele tentaria se tornar um mito ele mesmo?

As batidas cessaram. Um silêncio frio e absoluto caiu sobre o quarto, mais ameaçador do que o barulho.

— Onde? — sussurrou Billy.

— No único lugar onde a lenda e o homem se encontram e se confundem. No lugar onde ele escreveu o próprio nome nas pedras.

Olhei para o quadro de Billy, para a lama que ainda escorria, para a caligrafia antiga que parecia pulsar na tela.

— Vamos para a cidade velha. Para o **Arquivo Nacional**. Vargas não se escondeu na floresta, Billy. Ele se escondeu na história. E é lá que vamos encontrá-lo.

A porta finalmente cedeu, mas não se abriu. Ela se desintegrou em pó fino, revelando apenas a escuridão do corredor. E na escuridão, uma voz, seca como a Matinta Perera, mas com a autoridade de Anhangá, ecoou:

— **Você não vai a lugar nenhum, Hustler.**

Um vulto se materializou no batente, alto e esguio, vestindo um terno que parecia absorver a pouca luz do ambiente. Não era uma criatura da floresta, mas algo mais perigoso: um agente da ordem humana, corrompido pelo poder que Vargas havia despertado.

Ele segurava um objeto que refletia a luz do poste: não uma arma, mas um pedaço de giz, idêntico ao que Billy usara para desenhar.

— O tribunal da floresta cometeu um erro ao confiar em um passageiro. Vargas é propriedade do **Estado**. E você... você é uma testemunha que precisa ser silenciada.

— E o que você é? — desafiei, colocando Billy atrás de mim.
— Eu sou o **Guardião do Silêncio**. E o silêncio é a única coisa que resta quando as lendas se tornam verdade.

Ele ergueu o giz, e a linha traçada no ar começou a brilhar com uma luz azulada, como um raio prestes a atingir.

— **Última chance, Hustler. Entregue o caminho.**

— O caminho não se entrega, Guardião — respondi, puxando Billy para o lado e saltando pela janela. — **O caminho se faz.**

O som do vidro quebrando foi abafado pelo rugido do raio azul que atingiu o quarto, e caímos na rua escura, a missão agora clara: fugir do Guardião, encontrar Vargas no Arquivo Nacional, e levá-lo ao tribunal da floresta antes que o mundo dos homens e o mundo do mito colidissem de vez. O jogo havia começado.

CONTINUA... 

 POR ALCÍ SANTOS

22/09/2025

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 05

O silêncio pesava mais que a floresta inteira. As dez figuras me encaravam, e percebi que o círculo não era apenas de tochas — era um cerco. Não havia saída.

Engoli o medo e forcei a voz a sair firme, ainda que soasse como casca seca quebrando:
— Eu não trouxe Vargas até vocês. Se o nome dele aparece nas pedras, é porque ele já anda entre lendas e homens. Mas saibam: se ele escreveu, é porque queria ser visto. Quem se esconde não grava o próprio nome.A Iara ergueu o queixo, os cabelos se movendo como água agitada:
— Então você o entrega?

Olhei em volta. O Boitatá arqueava o corpo flamejante, como se já se preparasse para queimar cidades. O Mapinguari rosnava baixinho, saliva grossa escorrendo no chão. Cada um queria um sacrifício.

— Eu entrego a verdade — respondi, respirando fundo. — Se Vargas mexe com forças que não entende, ele deve ser julgado. Mas não pelos homens que ele engana... e sim por vocês, que ele afrontou.

O Curupira inclinou-se para a frente, pés marcando lama no chão de raízes:
— Palavras ousadas para quem é apenas passageiro. Você pede que sejamos juízes de nossa própria ruína.

— Sim — retruquei. — Porque se vocês destruírem humanos sem distinção, se virarem fogo e dente contra todos, vão virar só mais um pesadelo. E pesadelos... os homens esquecem.

A sombra de Anhangá moveu-se, os olhos em brasa fixos em mim.
— Ele fala como quem já nos viu sumir dos lábios das crianças.

Matinta Perera soltou um sopro gélido que apagou metade das tochas.
— Talvez Hustler esteja aqui não para ser punido, mas para ser usado.

Nesse momento, o Boto sorriu com um sorriso humano demais, os olhos cintilando.
— Ele pode ser nosso mensageiro. Levar Vargas até nós.

O Curupira ergueu a mão, e todos silenciaram.

— Então está decidido. Hustler, você terá uma chance. Se trouxer Vargas até este círculo, sua vida volta a ser sua. Se falhar... será lembrado apenas como mais um eco entre as árvores.

O chão tremeu, e senti a floresta engolindo o tribunal. Num piscar, estava de volta ao quarto. Billy estava de joelhos diante do quadro, a mão ainda suja de lama.
Ele ergueu o rosto para mim, pálido:
— O que eles disseram?

Do corredor, ecoaram de novo as três batidas secas.

— Que Vargas não é quem diz ser — murmurei. — E que agora... ele é nosso caminho.

CONTINUA...

POR ALCÍ SANTOS

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 04

O ar pareceu se dobrar sobre si mesmo quando os olhos do Curupira se abriram. Antes que Billy pudesse reagir, senti a pressão de mãos invisíveis me arrancando do quarto. Não houve grito. Só o som abafado de raízes se enroscando em volta do meu corpo, puxando-me para dentro da escuridão.

Quando a luz voltou, já não havia paredes. Estava em um círculo aberto no coração da mata, iluminado por tochas que ardiam sem consumir nada. Ao redor, dez figuras me observavam. Nenhuma delas era humana.

Eram as dez maiores lendas da Amazônia, reunidas como um tribunal antigo:

Curupira, de olhos faiscantes e pés virados.

Iara, seus cabelos escorrendo como rio noturno, cantando sem voz.

Boitatá, serpente de fogo, ondulando em espirais de brasas.

Mapinguari, gigante de um só olho e boca no estômago.

Matinta Perera, velha encurvada, o sopro dela trazendo o frio.

Boto cor-de-rosa, com seus olhos humanos demais.

Cobra-Grande, enrolada nos limites do círculo, respirando pesado.

Anhangá, o cervo fantasma de olhos em chamas.

Caboclo d’Água, gotejando no chão seco.

Mãe do Mato, coberta de folhas vivas, que murmuravam como vento.

O Curupira tomou a palavra, voz grave como tronco rompendo:
— Trouxe Hustler para ouvir o que se esqueceu. Há uma decisão a ser feita: destruir quem nos esquece... ou destruir quem nos inventou.

O círculo se moveu em murmúrios. Eu entendi. Não eram só humanos que estavam em julgamento, mas também as próprias lendas que se corromperam, usadas em histórias distorcidas.

Iara inclinou-se, apontando para mim com um dedo de água:
— Eles profanam o rio, cantam meu nome em festas de mentira, e riem.
Boitatá rugiu:
— E ateiam fogo na floresta, como se quisessem me convocar.

Foi então que a Matinta Perera, com sua voz de ferro e areia, se aproximou de mim.

— Há um humano suspeito, Curupira. Ele atravessou a mata com carvão nos bolsos e deixou símbolos na pedra. Um nome ele riscou, repetidas vezes... “Vargas”.

O nome caiu no círculo como pedra no lago. Billy não estava ali, mas eu podia sentir o medo dele dentro de mim.

O Curupira olhou para mim, olhos de fogo refletindo todos os outros.
— Hustler, você os trouxe. Cabe a você decidir: mostrar o culpado... ou pagar por ele.

As tochas arderam mais forte. E ao fundo, no vento, uma batida ritmada ecoou — três toques secos. O mesmo código da parede.

CONTINUA...

POR ALCÍ SANTOS

20/08/2025

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 03

 — A coisa aqui é séria, Hustler — murmurou Billy, ainda segurando a borda do quadro como se temesse que ele desaparecesse. Não respondi logo. O ar no quarto parecia ter engrossado, como se a umidade da floresta tivesse encontrado um caminho por baixo da porta, subindo pelas paredes e se instalando nos pulmões. 

A luz do fim da tarde escorria pela janela em faixas tortas, iluminando poeira suspensa no ar — partículas que dançavam como se obedecessem a um ritmo só seu.

— Ele não pareceu assustado — falei por fim, a voz mais baixa do que pretendia. — Parecia... avisado.

Billy virou o rosto para mim, os olhos estreitos. Ele sempre enxergava o mundo como um quebra-cabeça de sinais e coincidências. Eu, não. Eu enxergava o que estava à frente: tábuas rangendo, um gerente com camisa errada para o clima, e um quarto que cheirava a segredo e mofo.

— O Curupira vira os pés pra trás pra confundir quem o persegue — disse ele, como se estivesse lendo um livro invisível. — Mas por que todo mundo aqui parece estar fugindo dele... ou dele mesmo?

Antes que eu pudesse responder, um som cortou o silêncio: três batidas secas na parede, vindas do quarto ao lado. Não foi um toque casual. Foi ritmado. Um código. Uma chamada.

Fiquei imóvel. Billy soltou o quadro e deu um passo atrás.

— Você ouviu?

— Ouvi — respondi, mas já não tinha certeza se queria ter ouvido.

A porta rangeu de novo. Não foi aberta, mas sentimos a presença. Algo do lado de fora. Um leve movimento na fresta sob a soleira, como se uma sombra tivesse passado e parado ali, imóvel.

— Assim que estiverem acomodados — dissera Vargas — preciso falar com vocês. É urgente.

Mas quanto tempo fazia? Dez minutos? Quinze? E por que ele não voltava?

— Vamos esperar — sussurrei, mas já estava de pé, aproximando-me da janela. A mata cerrada se estendia além do vidro rachado, densa, verde-escura, como se engolisse a luz. Nada se movia. Nada, exceto um galho que balançou — sozinho.

— Hustler — chamou Billy, a voz trêmula pela primeira vez desde que saímos da cidade. — O quadro... mudou.

Virei-me devagar.

O desenho do Curupira continuava na parede. Mas agora os pés virados para trás estavam... sujos. Marcas de lama escorriam da tela, como se tivessem sido pisadas recentemente. E os olhos — antes apenas dois pontos escuros — agora refletiam algo. Um brilho. Um reflexo de fogo.

— Isso não é possível — disse Billy, mas não se afastou. Ao contrário, deu um passo à frente, como se aterrorizado e fascinado ao mesmo tempo.

— Não encoste nele — ordenei.

Mas foi tarde.

Ele tocou a tela com a ponta dos dedos.

E o quarto inteiro estremeceu.

Não foi um tremor de terra. Foi como se o tempo tivesse dado um salto, um piscar de olhos que durou mais do que deveria. A luz se apagou. A janela escureceu. E, por um instante — apenas um —, o cheiro de mofo desapareceu, substituído por cinzas, fumaça e algo doce, como flores apodrecendo.

Então, do corredor, veio o som de passos.

Mas não eram passos normais.

Eram desiguais. Um pé pisava para frente. O outro, para trás.

— Vargas? — chamei, mas minha voz soou estranha, abafada, como se viesse de longe.

Ninguém respondeu.

Os passos pararam diante da porta.

E então, uma voz — não de Vargas, não de ninguém que já tivéssemos ouvido — sussurrou, vinda de todos os lados ao mesmo tempo:

— Vocês não deveriam ter tocado.

O trinco da porta tremeu.

Mas não foi girado.

Foi empurrado para baixo, como se algo estivesse se espremendo por baixo, entrando devagar, com paciência infinita.

Billy recuou até a cama. Eu fiquei onde estava, olhos fixos na fresta sob a porta.

E então, vi.

Uma sombra se esticava pelo chão. Mas não seguia a luz da janela.

Ela se movia sozinha.

— Hustler — sussurrou Billy, a voz quase inaudível. — Ele não está aqui pra proteger a floresta...

Engoli em seco.

— Ele está aqui pra proteger ela de nós.

No teto, a pintura do Curupira sorria. E seus olhos, agora, estavam abertos.

 CONTINUA...

POR ALCÍ SANTOS

13/08/2025

VINGADOR NEGRO - VERDADE DE AÇO - CAPÍTULO 2 DE 10

O xerife Carl McCade, um homem na casa dos quarenta anos com aparência de cinquenta, tinha acordado irritado. Ele já era um sujeito irritado por natureza, seja porque tivera que tomar as responsabilidades de casa logo cedo por conta da morte de seu pai ou seja porque estava perdendo as estribeiras desde que se tornara o xerife de Austin. Indígenas, mexicanos, americanos e a guerra de etnia eterna, além do mascarado justiceiro agindo por conta própria. De um lado, o prefeito e os nobres cobrando a captura do mascarado, não por justiça, sim, McCade sabia que aqueles homens só estavam pensando em si mesmos. Enquanto isso, o povo mais pobre não buscava mais a ajuda da lei e sim de seu salvador vestido de negro.

A situação só piorara quando Jake Callahan, um bom jovem, mas emocionado por confrontos, trouxera uma dúzia de mexicanos para o escritório. Junto com Callahan, D. Hernandes e dois de seus capangas afirmando que os mexicanos haviam roubado bois de sua fazenda — que não ironicamente ficava ao lado do terreno dos mexicanos.

— Nós flagramos o roubo — Hernandes afirmou com o peito estufado e autoridade na voz. — Pergunte ao Jake.

Jake, como sempre, não demorou a confirmar:

— Escondidos em uma caverna por um arbusto.

— Señor, sequer sabíamos da existência de tal caverna em nosso terreno — um dos mexicanos comentou.

— Fique calado! Escória maldita.

— Ei, Hernandes, vamos com calma, eu estou há trinta anos com uma dor de cabeça dos infernos — o xerife falou.

— Senhor Hernandes, caro xerife. Gostaria de não perder os modos de etiqueta.

— Então não perca os modos com os mexicanos também, afinal, temos aqui uma acusação séria que precisava ser investigada.

— Investigada? — o homem quase perdeu as boas maneiras em seus trajes elegantes. — Não ouviu Jake e meus homens dizendo que encontraram meus bois no flagrante?!

McCade coçou os olhos de forma teatral.

— Como explicar…? Todos têm direito a uma investigação e a um julgamento justo.

— Até os mexicanos? — dessa vez foi Jake quem indagou.

— Se eles são seres racionais e pensantes, então de acordo com as leis desse país e dentro da minha jurisdição, sim. E nada será dito até que eu lhes chame para interrogatório.

— O senhor também quer nos interrogar, xerife? — um dos capangas de Hernandes pareceu indignado.

— Meu caro, não irei explicar como fazer meu trabalho, mas se quer fazer as coisas do seu jeito, sugiro que vá se tornar xerife.

— Já tinha ouvido falar do seu modo rude, mas nunca pensei ser verdade — Hernandes rebateu.

— Desculpe meu humor, D. Hernandes, mas eu não tenho tempo para tomar chá à tarde e contabilizar meus dólares no fim de semana. Tudo o que contabilizo são pessoas me enchendo a paciência e criando caso quando um boi sai de uma fazenda e aparece em outra.

Hernandes colocou a mão na cintura e disse:

— É isso que o senhor pensa?

— Essa seria a primeira dedução de qualquer pessoa sem segundas intenções. Mas, por favor, me permita terminar a minha investigação e depois terei prazer em dar meu veredito.

D. Hernandes e seus capangas deram de ombros e saíram do escritório, apenas Jake e os mexicanos permaneceram.

— Mas McCade, eu encontrei…

— Jake, por favor, me poupe de suas tolices.

O jovem baixou a cabeça com a cabeleira loura.

— Por todos os diabos, agora eu tenho que arrumar essa bagunça.


CONTINUA...


POR NAOR WILLIANS

26/07/2025

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 02

Ao atravessar o corredor de tábuas empenadas, fomos recebidos pelo gerente da pousada, Vargas. Usava uma camisa vinho de manga comprida — inadequada para o calor úmido — e sorria como quem tenta disfarçar pressa. Cumprimentou Billy com um aperto de mão formal demais para um garoto e me lançou um olhar demorado, como se buscasse decifrar códigos antigos no meu rosto.— Vocês são os últimos hóspedes a chegar. Espero que a viagem não tenha sido cansativa — disse, desviando o olhar para o registro na prancheta. — Cuidamos da segurança aqui. Se precisarem de qualquer coisa, me procurem.

O quarto era apertado, com uma janela voltada para a mata cerrada e paredes cobertas por pinturas rústicas. Billy caminhou até um quadro próximo à porta, examinando com atenção o desenho de uma criatura de cabelos flamejantes e pés virados para trás. Outras ilustrações do mesmo personagem — entre árvores, fogueiras, até mesmo no teto — marcavam presença em cada canto. O sotaque apressado de Vargas soou atrás de nós:

— Aqui chamam de Curupira. Protetor da floresta. Dizem que confunde caçadores e quem entra sem permissão.

Billy tocou o quadro suavemente, olhos brilhando de perguntas não feitas. Me sentei na cama, tentando não pensar no fato de que o colchão parecia ligeiramente úmido, nem no cheiro persistente de mofo. Vargas ajustou a persiana improvisada e, antes de sair, parou na porta.

— Assim que estiverem acomodados, preciso falar com vocês. É urgente — disse, a voz baixa, tão grave quanto promissora de segredos. O rangido da porta ecoou após sua saída. Billy segurou uma das ilustrações do Curupira, o olhar fixo nos pés ao contrário. 

— Se até o gerente parece assustado, é porque a coisa aqui é séria, Hustler — murmurou. O silêncio, enfim, pareceu mais cheio do que nunca. 

CONTINUA...

POR ALCÍ SANTOS 

VINGADOR NEGRO - VERDADE DE AÇO - CAPÍTULO 1 DE 10

Quando D. Gabriel despertou naquela manhã desconfiou de algo errado já que tinha ouvido certo burburinho vindo do andar de baixo da casa, mas apenas ao ver Emília e Sancho, dois de seus empregados, teve a certeza.
Eles haviam preparado a mesa com o café da manhã, mas ele sequer sentou antes de perguntar:
— O que aconteceu?
Emília ajeitou o cabelo preto em contraste com sua pele morena e falou:
— Nada para o senhor esquentar a cabeça, D. Gabriel.
— Se você não quiser contar, talvez Sancho me conte — ele disse com um sorriso sarcástico no rosto.
Sancho era um sujeito calvo vestido com uma calça suja e uma camisa que outrora fora branca. Ele lançou um olhar desconfiado para Emília que retribuiu com um olhar de reprovação.
— Não é necessário se preocupar, señor.
— Então irei descobrir na cidade.
Emília agarrou um pedaço do tecido do vestido entre dedos e disse:
— Não queremos que pense que estamos pedindo a sua ajuda, D. Gabriel. Já somos muito gratos pelo emprego. Nem todos os dons de Austin contratariam estrangeiros.
— Bah! Não fico emocionado com a bajulação, mas ficarei grato se compartilharem comigo o motivo de sua angústia.
Notando que seu senhor era irredutível, a mulher finalmente contou a verdade:
— São os mexicanos. Deve se lembrar de que os ajudou a comprar uma porção de terra há alguns meses.
— Sim, estou lembrado — ele concordou tomando um pouco de café. — Há alguns de seus primos entre eles, certo?
Os dois assentiram.
— Bem, ficamos sabendo que foram acusados de roubo esta manhã. Uma dúzia deles está presa na delegacia de Austin — foi Sancho quem explicou.
D. Gabriel desistiu de colocar o pedaço de bolo de milho na boca e perguntou:
— Quem fez a acusação?
— D. Hernandes Torres, o rancheiro que já foi do exército.
Gabriel pousou a mão no queixo e ficou pensativo por alguns segundos.
— O que o xerife disse?
— Ainda não se pronunciou, mas é a palavra de Torres e seus homens contra a dos mexicanos. Quem o senhor acha que vai triunfar? — Sancho falou de modo quase desesperado.
Gabriel limpou a boca, se levantou e saiu à procura de seu chapéu. Emília desembestou atrás dele como um caçador em busca da presa.
— Senhor, por favor, não precisa fazer isso.
— O que pensa que vou fazer? — o jovem perguntou erguendo a sobrancelha.
— Não precisa se meter em confusão para nos ajudar mais uma vez. O senhor já fez muito quando facilitou a compra daquelas terras.
— E se me lembro bem, D. Gaspar não gostou nada de sua intromissão — Sancho complementou.
Gabriel soltou uma risada sarcástica e segurou os dois pelos ombros em seguida.
— Meus caros, eu me viro com esses engomados de gravata. O que pretendo é garantir que seus parentes terão um julgamento justo.
E deixou-os para ir até a cidade.

CONTINUA...

POR NAÔR WILLIANS

23/07/2025

CORREIO ÔMEGA

 Salve, pessoal!


Passando por aqui para avisar que teremos uma nova aventura do Vingador Negro! Dessa vez, nosso vigilante mascarado terá que ajudar um grupo de mexicanos acusados de roubo por um rancheiro de Austin.

Essa nova história estreia nessa sexta feira. Não percam!

Além disso, se o tempo me permitir, teremos a volta de John Caveira, o caçador de recompensas, até o final do ano. Torçam para que dê certo, pois acredito que estamos sem aventuras individuais do John desde 2017. É tempo pra caramba! E venho ensaiando o retorno dele há bastante tempo, mas sem sucesso. Na verdade, venho ensaiando o retorno de VN e JC faz anos. Bem, um deles saiu do ensaio. Esperemos que o outro também.

Mega abraço.

NAÔR WILLIANS - O ESCRITOR DOS ENSAIOS


18/07/2025

HUSTLER - A ILHA - CAPITULO 01

O cheiro de mofo e salitre impregnava o convés inferior do navio quando adotei meu vigésimo terceiro nome: Hustler. Um termo que corta como lâmina —pode significar trapaceiro, sobrevivente, ou apenas alguém que se recusa a morrer.
Minhas unhas afundavam na madeira úmida enquanto eu contava os passos dos marinheiros no piso superior. Vinte e cinco anos fugindo me ensinaram: até um suspiro pode ser pista.
Las Vegas ainda habita meus pesadelos. O brilho dourado dos cassinos se faz agulhas sob minha pele; o sabor amargo da cocaína misturado a sangue, mordendo próprio  lábio para não expor nomes.
Eu lia rostos melhor que livros — uma pálpebra tremula antes da mentira, um dedo coça o polegar sutilmente antes da traição. Construí um império decifrando esses detalhes.
E o perdi do mesmo modo. Agora, no transatlântico Voyager, meu corpo se escondia junto à parede da cozinha, observando os passageiros através do monitor de segurança.
Mãos se apertavam com força desnecessária. Riso durava um segundo a menos do que o necessário. Até o garçom, inclinando levemente o copo de champanhe — um ex-agente da Interpol, se minha intuição ainda valia algo. No terceiro dia, o garoto rompeu meu protocolo.
Billy. Dez anos, cabelos negros como as asas do corvo que matei na infância para provar que não sentia medo. Ele não apenas olhava as pessoas — as dissecava. Seus olhos recaíam sobre cada gesto: o capitão alisando o queixo ao mentir sobre o atraso, a socialite francesa tocando o pingente de rubi sempre que mencionavam o magnata desaparecido do petróleo. A primeira conversa foi um duelo silencioso:
— Você também enxerga os padrões — ele declarou, empilhando cubos de açúcar em forma de pirâmide.
Meu café esfriou enquanto, sem perceber, eu replicava sua construção com sachês de adoçante. O navio balançou e nossas torres ruíram ao mesmo tempo. Na escola isolada da Suíça onde nos escondemos depois, Billy aperfeiçoou seu método. Anotava em códigos as inconsistências dos professores:
— O professor de química cheira a pólvora depois das "aulas particulares" com a diretora — sussurrou numa noite, desenhando equações invisíveis no ar pesado do dormitório.
Eu fingia ignorar o caderno, repleto de setas conectando desaparecimentos de alunos a visitas "oficiais" ao porão. Agora, na Amazônia, é a floresta que nos observa. 
O ar pesa como um cobertor molhado sobre os pulmões. Billy congela diante de uma árvore marcada por garras a exatos 1,83 metros — altura média de um homem adulto. Seus dedos tremem ao tocar os sulcos, enquanto eu conto os gritos de arara que soam quase como palavras humanas.
— Eles estão nos testando — ele murmura.
Não preciso perguntar quem. A selva respira em sincronia com minha frequência cardíaca.
As folhas murmuram meu nome verdadeiro — aquele que nem Billy conhece. Bom, eu acho que não. À noite, entre os sons que rastejam para dentro da barraca, Billy me pergunta pela sétima vez por que fugimos de Vegas. Meus dentes perfuram a bochecha até saborear o metal do passado. O psicopata que fui ou que forjaram em mim, sorri das trevas.
A selva não é inimiga. É espelho. E, no rio negro que corta entre as árvores ancestrais, vejo refletido não o rosto de agora, mas o da menina que incendiou seu primeiro cassino aos doze anos. Billy aperta minha mão gelada enquanto o último fragmento de mim que ainda tenta ser humano sussurra:
"Desta vez, ao corrermos, será em direção à verdade ou fugindo dela?"
 
CONTINUA...
 
POR ALCÍ SANTOS  

16/07/2025

CORREIO ÔMEGA

Boa tarde a todos os leitores.

Estou "aparando" alguns personagens pois durante os anos eu Alcí Santos e meu amigo Naôr Willians, criamos vários personagens e devido ao nosso tempo não estamos conseguindo dar conta de todas as histórias.

Da minha parte, permanecerão com mais temporadas os seguintes heróis e  com menos temporadas indicarei com um asterisco.

- 12⁰ D.P.

- HUSTLER (Temporada de 2025)

- Detetive Alcí *

- Querub e Diab *

- HZW e T-35 *

 - Vingador Negro (a cargo de Naôr)

 - O CAVEIRA (a cargo de Naôr)

Estarei entrando em contato com Naôr para saber se ele publicará neste ano de 2025.

Um abraço a todos.

ALCÍ SANTOS  

25/12/2024

C.H.I.L.D. (O FINAL) - CAPÍTULO 10 de 10

 

Todos os integrantes do C.H.I.L.D. se prepararam para viajar de avião com o Capitão Frank, na esperança de que aquela aventura pudesse aproximá-los ainda mais de seu objetivo em comum. No entanto, antes de embarcar, Prionalurus, T-35, HZW, Querub e Diab anunciaram que preferiam seguir outras rotas e continuariam suas aventuras por conta própria. A despedida foi breve, mas carregada de promessas de reencontros no futuro.

Enquanto o grupo principal do C.H.I.L.D. decolava ao lado do Capitão Frank, uma tempestade se formou subitamente no céu. Nuvens densas cobriram o horizonte, e o estrondo de um raio ecoou de maneira aterradora. Em um piscar de olhos, a descarga elétrica atingiu a aeronave, que explodiu em mil fragmentos luminosos.

Daquele instante em diante, tudo o que restou foi o silêncio e o pressentimento de que a história do C.H.I.L.D. havia chegado ao fim ali mesmo, nas alturas. O sacrifício, embora repentino, permaneceu marcado nos céus, como uma lembrança trágica.

Prionalurus, T-35, HZW, Querub e Diab, já distantes, perceberam algo estranho ao longe, mas jamais poderiam imaginar que aquela seria a despedida final de seus velhos companheiros. E assim, sem sequer se darem conta de que o C.H.I.L.D. tinha chegado ao fim, continuaram suas jornadas, cada um trilhando seu próprio caminho, carregando na memória as lembranças de um grupo que, mesmo em tão pouco tempo, mudara suas vidas para sempre.

Por Alcí Santos 


ATÉ A PROXIMA TEMPORADA

COM SERIES ELSIEWORLDS.

C.H.I.L.D. (O FINAL) - CAPÍTULO 9 de 10

 

O vento soprou de leve, trazendo consigo o aroma da relva molhada e o farfalhar das folhas. Depois de tantos embates e revelações, o silêncio que se instaurou parecia quase sagrado — um raro momento de tranquilidade em meio ao caos que os perseguia.

Rebecca foi a primeira a romper o silêncio. Ela guardou sua arma em um coldre lateral e deu alguns passos à frente, observando com atenção os arredores, agora livres de qualquer resquício do Vigia ou de sua energia.

— Certo, pessoal — disse, com a voz mais firme. — Precisamos decidir nosso próximo passo. Foi um grande avanço ter destruído essa barreira e revelado o verdadeiro inimigo, mas ainda não sabemos quais eram as intenções do Elementar Primordial.

HZW, com a esfera de energia já dispersa, colocou as mãos nos bolsos e franziu a testa.

— Precisamos descobrir onde essa criatura foi parar. Se é mesmo um Elementar Primordial, ele provavelmente não foi obliterado por completo, apenas banido para algum outro lugar.

T-35 concordou.

— Ele vai tentar voltar. Nós o jogamos em um vórtice, mas ainda não sabemos ao certo qual o destino final desse portal. — Ele lançou um olhar para Prionailurus. — Alguma ideia, Pri?

O Gato Impossível arqueou as orelhas, pensativo.

— Quando abro essas fendas, geralmente as crio para lugares longínquos e isolados, onde a realidade é mais fluida. O Elementar Primordial pode até voltar, mas, se o fizer, levará tempo. — Ele meneou a cauda, pensativo. — Ainda assim, concordo com Rebecca: precisamos entender o propósito desse ataque.

Querub aproximou-se, com uma expressão determinada.

— Então, devemos procurar informações. — Ele olhou para Rebecca. — Sei que você conhece pessoas que lidam com arquivos antigos e histórias ancestrais. Talvez elas possam nos dar pistas sobre esse Elementar Primordial e o que o motiva.

Rebecca assentiu.

— Conheço, sim. Podemos seguir para o Arquivo do Círculo, na capital. Eles mantêm registros de diversas eras. — Ela respirou fundo, como se ponderasse as consequências. — Será arriscado; nossas identidades podem estar comprometidas, mas não temos muita escolha.

Diab deu um passo em direção ao círculo de colegas.

— Estamos em menor número e meio expostos, mas, com a ajuda de Prionailurus, talvez possamos chegar lá sem ser notados. — Ele trocou um olhar cúmplice com Querub. — Principalmente se combinarmos nossa luz e sombras para confundir qualquer perseguidor.

Prionailurus, ao ouvir seu nome, ergueu-se e se espreguiçou, felinamente.

— Posso criar atalhos, se necessário. Não tão grandes quanto os que usei contra o Vigia, mas o suficiente para passarmos despercebidos. — Ele lambeu uma das patas antes de completar: — Contudo, não consigo manter muitos portais ao mesmo tempo. Precisamos planejar bem.

Rebecca voltou a encarar o grupo. Agora, todos estavam em sua linha de visão.

— Então é isso. Vamos reunir suprimentos, descansar algumas horas e partir ao amanhecer. O Arquivo do Círculo será nosso próximo destino. Lá, esperamos encontrar respostas sobre o Elementar Primordial.

T-35 colocou a mão no ombro de Rebecca em sinal de apoio.

— Pode contar comigo. E com Pri. — Ele sorriu para o gato. — Essa aventura só está começando.

Querub e Diab também assentiram, cada qual guardando suas próprias reflexões. HZW, ainda pensativo, olhou para o horizonte, onde o sol começava a declinar.

— Que venha o próximo capítulo, então.

Prionailurus meneou a cauda, satisfeito.

— Prometo que farei o possível para que, desta vez, vocês não caiam em armadilhas tão facilmente.

Diante das últimas palavras do felino, todos se olharam, compartilhando um misto de apreensão e esperança. Sabiam que os desafios ainda estariam por vir, mas, juntos — e com a ajuda do Gato Impossível —, as chances de prevalecerem eram maiores do que nunca.

O vento soprou mais uma vez, como se abençoasse a nova jornada do grupo. O crepúsculo aproximava-se, pintando o céu com tons de laranja e rosa. Restava apenas aguardarem o amanhecer para seguirem rumo ao Arquivo do Círculo — e para uma nova página de suas histórias.

CONCLUI A SEGUIR...

Por Alcí Santos

09/12/2024

C.H.I.L.D. (O FINAL) - CAPÍTULO 8 de 10

 A escuridão que envolvia a clareira foi quebrada por um brilho dourado que cortou o ar como um relâmpago silencioso. Por um breve momento, a sombra do Vigia pareceu estremecer, e um som sutil, como o tilintar de sinos, ecoou na floresta.

Uma figura ágil e silenciosa saltou de uma árvore próxima, pousando suavemente no centro da clareira.

— Cheguei a tempo, como sempre. — A voz era calma, sem pressa, mas carregada de firmeza.

Do centro da luz dourada surgiu uma criatura peculiar. Um gato. Não, ele não era um gato comum. Seu corpo esguio e elegante lembrava o de um felino selvagem, mas seus olhos brilhavam como estrelas distantes. Sua pelagem era de um tom amarelado puro e uniforme, reluzindo como ouro polido sob o sol do meio-dia. Sem listras, sem manchas, apenas um brilho homogêneo que parecia emitir luz própria. Era Prionailurus, o Gato Impossível.

T-35 deu um passo à frente, seus olhos azuis se iluminando de alegria e alívio.

— Pri! Finalmente, cara! — Ele sorriu largo, como alguém que encontra um velho amigo no meio do caos.

— Eu sabia que você viria.

Prionailurus se aproximou calmamente, andando com a leveza de quem não tinha pressa.

— Eu sempre apareço, T-35. — Ele se sentou ao lado de T-35 e começou a limpar uma das patas, como se não houvesse uma batalha iminente acontecendo.

 — Mas parece que vocês se meteram numa bagunça maior do que o normal desta vez.

Rebecca estreitou os olhos, claramente surpresa.

— Espera... vocês se conhecem? — Ela olhou de T-35 para o gato, o rosto cheio de dúvidas.

Querub observou Prionailurus com um olhar analítico.

— Isso... isso não faz sentido. O Gato Impossível nunca se junta a ninguém, a não ser... Todos sabem disso.

T-35 deu de ombros.

— Sim, ele não se junta a qualquer um. Mas ele e eu somos diferentes. A gente se encontrou aelgumas vezes e... — Ele olhou para Prionailurus com um sorriso. — Digamos que nos entendemos. Não foi, Pri?

Prionailurus deu uma olhada para T-35 e depois voltou a limpar a pata.

— Sim, T-35. A gente se entende. Mais do que você imagina.

Rebecca cruzou os braços.

— Tá, tá, tá... Isso ainda não explica como você, o Gato Impossível, está andando com o nosso grupo. Qual é a história aqui?

Prionailurus levantou a cabeça, seus olhos felinos fixos nela.

— Vocês não sabem? — Ele olhou para o grupo inteiro, movendo o olhar de um para o outro. — Eu não sou apenas o Gato Impossível. Eu fui o parceiro do Homem Impossível.

Silêncio total.

Querub ofegou de surpresa.

— O Homem Impossível? — Ele se inclinou para a frente, claramente chocado.

Diab ergueu as mãos, incrédulo.

— Não, não, não... Você está dizendo que você era o parceiro dele? — Ele balançou a cabeça. — Isso não faz sentido. O Homem Impossível não precisava de parceiro. Ele fazia tudo sozinho.

Prionailurus soltou um suspiro longo e cansado.

— É isso que todos acham, porque é assim que as lendas são contadas. Mas não foi assim que aconteceu. — Ele olhou para o céu, como se revivesse as memórias. — O Homem Impossível e eu... tínhamos os mesmos poderes.

Todos pararam de falar.

Rebecca olhou fixamente para o gato.

— Como assim... os mesmos poderes? — Ela franziu a testa, sua mente tentando entender. — Vocês dois podiam... cortar as regras?

Prionailurus assentiu lentamente.

— Sim. O Homem Impossível era chamado assim não porque ele "desafiava as leis do universo", mas porque ele as reescrevia. E eu também.

Ele olhou para a própria pata, fechando-a levemente como se segurasse o próprio ar.

— Podemos cortar o tecido da realidade, anular regras, mudar a natureza de qualquer coisa que nos limite. É por isso que ele nunca ficou preso por muito tempo. E por isso que eu estou aqui agora.

HZW deu um passo à frente, o olhar sério.

— Isso não faz sentido. Se ele tinha todo esse poder, por que precisava de você?

Prionailurus deu de ombros, ainda olhando para a pata.

— Porque... ele era humano. — Ele olhou para HZW, seus olhos dourados brilhando com intensidade.

— E humanos cometem erros. Humanos duvidam. Humanos hesitam. O Homem Impossível nunca hesitou em lutar, mas às vezes, ele não conseguia ver todas as possibilidades. Eu via. Eu via tudo.

Rebecca suspirou pesadamente.

— Então, vocês não eram "companheiros". Vocês eram iguais.

T-35 apontou para Prionailurus com um sorriso orgulhoso.

— E é por isso que ele é o meu parceiro. Vocês não estão entendendo. Ele não só está "ajudando" a gente. Ele está garantindo que a gente não caia. — Ele olhou para Prionailurus. — Foi ou não foi, Pri? Você nunca deixou o Homem Impossível falhar. E não vai deixar a gente falhar também, né?

Prionailurus olhou para T-35 e deu um leve sorriso.

— Nunca deixei ele falhar. E não vou deixar vocês falharem também.

O Vigia, que até então assistia em silêncio, ergueu a voz, cortando o momento.

— CHEGA DESSA CONVERSA! — Sua voz ecoou como trovões. — NÃO IMPORTA O QUE VOCÊS ERAM NO PASSADO! EU SOU O CICLO! EU SOU O JULGAMENTO!

Prionailurus deu um passo à frente, agora encarando o Vigia de frente.

— Você não é o ciclo. — Ele disse, com um tom firme e tranquilo.

— Você é o Elementar Primordial disfarçado. Eu já vi esse truque antes. Já vi deuses se vestirem de "julgamento" e "equilíbrio" para justificar suas ações. — Seus olhos se estreitaram. — Mas eu vejo além da máscara.

O Vigia deu um passo para trás, mas sua voz continuou firme.

— MENTIRA! EU SOU O JULGAMENTO!

Prionailurus levantou a pata lentamente.

— Não. Você é só mais um trapaceiro tentando controlar o tabuleiro. — Ele cortou o ar com um movimento suave.

O ar se partiu. Literalmente.

Um corte dourado surgiu no espaço, como uma rachadura no próprio ar.

A barreira ao redor de T-35, Rebecca, Diab, Querub e HZW quebrou instantaneamente, como vidro despedaçado.

Rebecca ergueu a arma, agora livre.

— Então, ele estava mentindo o tempo todo...

HZW levantou as mãos, conjurando uma esfera azul de energia.

— E agora ele vai pagar por isso.

Querub e Diab se entreolharam e assentiram. As sombras de Diab envolveram a luz de Querub, criando uma esfera de luz azul e sombras negras entrelaçadas.

Prionailurus deu o último passo à frente.

— Chegou a hora de você parar. — Ele olhou para T-35. — Vamos juntos?

T-35 sorriu, sua energia azul crescendo ao redor de seus punhos.

— Juntos. Dessa vez, sem cair.

Com um último golpe, Prionailurus cortou o espaço com uma precisão cirúrgica. O vórtice dourado se abriu atrás do Vigia.

— Adeus, ciclo. — Ele disse, com firmeza.

O vórtice sugou o Vigia com uma força brutal.

— NÃO! NÃO! — O Vigia foi puxado, sua voz sumindo no vazio.

O céu voltou a ser azul.

Prionailurus, sentado calmamente ao lado de T-35, olhou para o grupo.

— E então? Eu posso ficar no grupo?

T-35 olhou para Prionailurus e sorriu.

— Você nunca saiu, Pri. Você nunca saiu.

O grupo riu juntos, enquanto o Gato Impossível fechava os olhos, ronronando ao som do vento suave.

CONTINUA...

Por Alcí Santos

C.H.I.L.D. (O FINAL) - CAPÍTULO 7 de 10

 O silêncio na clareira era quase palpável, preenchido apenas pelo som suave das folhas balançando ao vento. Todos olhavam para o céu, onde o rastro de energia dourada ainda cintilava, se dissipando lentamente. A sensação de paz era real, mas uma tensão sutil ainda pairava no ar.

T-35 apertou o abraço em HZW, como se quisesse se certificar de que ele realmente estava ali. Os olhos de HZW brilhavam como o oceano iluminado pelo sol, e ele retribuiu o abraço com força.

— Também te amo, mano — disse HZW, tentando conter o choro. — E agora podemos fazer isso juntos de verdade. Como antes.

Donny sorriu e cruzou os braços, inclinando-se levemente para eles.

— Vocês dois... Se quiserem um momento de irmãos emocionados, a gente pode dar privacidade.

Rebecca balançou a cabeça, mas o sorriso suave no canto de sua boca não passou despercebido. Mesmo após tantas batalhas, era bom ver aqueles dois juntos.

— Vamos aproveitar essa paz enquanto podemos — disse Rebecca, ainda observando a clareira. — Algo me diz que isso não vai durar muito.

Diab se afastou do grupo, o olhar fixo no horizonte, onde o brilho dourado finalmente desapareceu. Seu semblante era sério, os olhos vermelhos como brasas refletindo preocupação.

— Você está certo, Rebecca — disse ele em tom baixo. — Isso não acabou. O Elementar pode ter cedido por enquanto, mas forças maiores se movem além do que vimos aqui.

Querub virou-se na direção de Diab, sua expressão ainda calma, mas com um brilho de preocupação.

— Você sentiu isso também, não foi? — perguntou Querub, olhando para o irmão com um ar compreensivo.

— Senti — respondeu Diab, apertando os punhos. — Aquela energia... não era só do Elementar. Alguém mais estava observando.

Rebecca arregalou os olhos, girando para encarar Diab.

— O quê? Quem mais poderia estar envolvido nisso?

T-35 deu um salto e caiu ao lado de Diab, batendo as mãos nos quadris. — Ah, não me diga que tem "vilão escondido na sombra" agora. Já passamos pelo chefão, não? Isso não é um jogo de fases, galera.

— Quem dera fosse um jogo, garoto — disse Diab, lançando-lhe um olhar sério. — Não estamos sozinhos. Não estivemos desde o início.

O grupo ficou em silêncio. Mesmo T-35, sempre cheio de energia, olhou para o chão, pensativo.

Donny foi o primeiro a quebrar o silêncio. — Se tem alguém lá fora puxando as cordas, então precisamos nos preparar. Mas, antes disso, devemos cuidar de Ian. — Ele apontou para o garoto, que ainda estava sentado próximo a uma árvore, ofegante, mas agora claramente mais forte do que antes.

Querub foi até Ian, ajoelhando-se à sua frente. Com uma mão suave sobre o ombro do menino, ele sorriu.

— Consegue se levantar, Ian? Seus poderes estão de volta. Seu espírito também.

Ian ergueu os olhos para Querub, com uma expressão de cansaço e determinação.

— Consigo, sim. Eu... eu só preciso de um momento. — Ele respirou fundo, o brilho dourado nos seus olhos voltando lentamente. — Eu nunca pensei que pudesse sentir isso de novo.

— É assim que começa a cura — disse Querub, ajudando-o a se levantar. — Vamos dar um passo de cada vez.

HZW olhou para o céu, seus olhos fixos em algo que só ele parecia ver.

— Eles estão vindo.

Rebecca olhou para ele, os olhos estreitos.

— Eles quem?

— Não sei, mas tem algo no céu. Algo grande. — HZW apontou para o céu, onde uma linha fina e preta cortava as nuvens, como se o céu estivesse rachando. — Não parece natural.

Todos levantaram os olhos.

A rachadura no céu se alargou, revelando um brilho violeta intenso. Não era apenas uma rachadura. Era um portal.

T-35 franziu o cenho.

— Ah, não... Por favor, não. Não agora. Eu acabei de me transformar em jato de novo. Não posso fazer isso duas vezes seguidas!

Uma energia densa começou a sair do portal, semelhante a uma névoa negra, mas com uma viscosidade que se agarrava ao ar. O cheiro de enxofre e ferro queimado preencheu o ambiente. Rebecca imediatamente pegou sua arma e a carregou, seus olhos fixos no portal.

— Posições de combate! Não sabemos o que está vindo, mas eu garanto que não é nada amigável.

O portal pulsou três vezes, como um coração batendo.

Diab deu um passo à frente, as sombras ao redor de seus pés se alongando e se enrolando em torno de suas pernas. Seus olhos vermelhos brilhavam intensamente.

— Não se preocupem. Seja o que for, vamos cortar a raiz dessa vez.

Querub levantou as duas mãos, invocando uma barreira de luz ao redor de Ian e Donny.

— Isso vai proteger vocês. Deixe o resto conosco.

Donny socou o ar, o rosto contorcido em frustração. — Eu posso lutar também, não precisa me proteger o tempo todo.

Querub olhou para ele com serenidade.

— Eu sei que pode, Donny. Mas se você cair, não teremos ninguém para salvar Ian. E não posso deixar isso acontecer.

O portal se abriu por completo.

De dentro, três figuras começaram a se materializar. Duas tinham a forma de crianças, enquanto a terceira era uma figura imensa e encapuzada, de pelo menos três metros de altura.

— Quem... — Rebecca começou a perguntar, mas parou assim que a figura encapuzada olhou diretamente para ela.

Os olhos da figura eram duas órbitas de luz roxa incandescente.

— Vocês interferiram demais — disse a figura, sua voz soando como múltiplas vozes ao mesmo tempo. — Eu avisei o Elementar. Agora ele não pode mais protegê-los.

As duas crianças avançaram, seus rostos pálidos como cera, mas com olhos completamente negros. Elas abriram as bocas, e uma fumaça negra saiu, distorcendo o ar ao seu redor.

— Esses são os Sombrios — disse Diab, cerrando os punhos, suas sombras ganhando forma de lâminas. — Eles não falam. Só obedecem.

Rebecca mirou na figura encapuzada, o dedo no gatilho. — E você? Quem é você?

A figura encapuzada deu um passo à frente, o chão abaixo de seus pés rachando.

— Eu sou o Vigia. E agora, eu vigio vocês.

O coração de Rebecca acelerou. — Isso não soa como uma coisa boa.

— Não — disse Querub, com uma expressão mais séria do que o normal. — Ele não está aqui para observar. Ele está aqui para julgar.

Os Sombrios avançaram.

Rebecca disparou contra eles, mas as balas foram engolidas pela névoa negra ao redor de seus corpos. Diab mergulhou nas sombras, surgindo atrás de uma das crianças e golpeando-a com suas lâminas escuras.

— Eles são rápidos, mas eu sou mais — disse ele, com um sorriso de confiança.

T-35 se transformou em jato novamente, disparando rajadas de energia contra a névoa.

— Certo, "Vigia", vamos ver quem vigia quem!

O Vigia não se moveu.

— Eu não vim lutar. Vim julgar. Se forem dignos, permanecerão. Se falharem, serão esquecidos.

HZW levantou a mão, criando uma barreira de energia brilhante ao redor do grupo.

— Ninguém vai ser esquecido hoje, Vigia. — Sua voz tinha uma firmeza que ninguém havia visto antes.

A batalha começou.

Querub ergueu as duas mãos, conjurando uma esfera de luz azul intensa que crescia a cada segundo. Diab, ao seu lado, fez o mesmo, mas com uma esfera de sombras negras. As duas energias opostas começaram a girar uma ao redor da outra, formando uma espiral.

Rebecca engoliu em seco.

— O que estão fazendo?

Querub e Diab olharam para o grupo e falaram ao mesmo tempo:

— Estamos encerrando isso.

A espiral de luz e sombra explodiu, iluminando toda a floresta.

CONTINUA...

Por Alcí Santos 

02/12/2024

C.H.I.L.D. (O FINAL) - CAPÍTULO 6 de 10

 

Enquanto o grupo avançava pela floresta, o som de algo cortando o ar tornou-se mais intenso. Rebecca levantou a mão, sinalizando para que todos parassem.

 O ruído aumentou até que um jato azul com detalhes brancos surgiu entre as árvores, descendo com precisão e pousando suavemente em uma clareira.

Rebecca sorriu levemente ao reconhecer as cores familiares.

— T-35 finalmente chegou. Estávamos esperando por você.

Donny cruzou os braços e riu.

— Sempre gosta de aparecer no último segundo, hein?

O jato começou a se transformar, suas placas metálicas se movendo com fluidez, ajustando-se até revelar a figura de um garoto de 9 anos. Ele parecia completamente humano, com cabelos castanhos curtos, olhos azuis brilhantes e roupas que refletiam as cores do jato: azul e branco. Ele tinha um sorriso travesso e confiante, parecendo pronto para enfrentar qualquer coisa.

— T-35, ao seu dispor! — anunciou ele, colocando as mãos na cintura. Sua voz era clara e cheia de energia, idêntica à de HZW.

HZW deu um passo à frente, com um pequeno sorriso.

— Como sempre, gosta de uma entrada dramática.

— Ei, irmão, estilo é tudo. Além disso, quem mais aqui pode ser um jato e um garoto incrível ao mesmo tempo? — T-35 piscou para o grupo.

Rebecca manteve a postura firme, mas sua expressão suavizou.

— Certo, T-35. Precisamos de você. O Elementar Primordial está perto, e esta pode ser nossa única chance de enfrentá-lo.

— Então vamos acabar com ele. Estou pronto para isso. — T-35 sorriu, animado.

De repente, o chão tremeu levemente, e uma energia peculiar atravessou o local. Duas figuras surgiram das árvores, caminhando lado a lado. Apesar de sua aparência infantil, com cerca de 8 anos, ambos exalavam uma presença poderosa.

Querub tinha cabelos loiros que brilhavam sob a luz natural e olhos azuis profundos que transmitiam calma e determinação. Ele vestia roupas brancas com detalhes dourados que irradiavam energia. Diab, ao seu lado, tinha cabelos ruivos intensos que pareciam refletir a luz ao seu redor, olhos vermelhos que brilhavam como brasas, e vestia roupas escuras com detalhes em vermelho. Sua postura era firme e confiante, contrastando com a serenidade de Querub.

Querub deu um pequeno sorriso, analisando T-35.

— Então, você é o reforço? Fascinante. Sua energia é única.

Diab cruzou os braços, inclinando levemente a cabeça enquanto avaliava T-35. — Ele parece criança como nós, mas gosto da atitude. Vamos ver se consegue acompanhar.

— Conseguir acompanhar?

T-35 ergueu uma sobrancelha e colocou as mãos na cintura.

— Vocês vão precisar correr para não ficar para trás.

Querub manteve o sorriso gentil.

— A confiança dele é inspiradora. Mas vamos ver como você age na batalha.

Diab soltou um riso baixo.

— Espero que impressione, menino.

Rebecca interrompeu com firmeza, chamando todos ao foco.

— O Elementar Primordial está perto. Precisamos de todos vocês. Trabalhem juntos. Não podemos falhar.

O chão começou a tremer violentamente, e uma onda de calor atravessou a floresta. O Elementar Primordial surgiu entre as árvores, acompanhado por uma legião de soldados elementais feitos de fogo e pedra. Sua presença era colossal, e cada passo fazia o solo estremecer.

— Vocês ousam resistir? — rugiu ele, sua voz ecoando como trovões. — Eu vou consumir todos vocês!

Rebecca ergueu sua arma, encarando o inimigo com determinação. — Pode tentar. Mas você vai cair.

T-35 imediatamente se transformou em jato, decolando e lançando rajadas de energia que abriram caminho entre os soldados elementais. Querub avançou com passos firmes, sua energia luminosa irradiando ao seu redor enquanto desintegrava os inimigos com rajadas de luz azulada. Diab desapareceu nas sombras, surgindo atrás dos adversários e os destruindo com ataques rápidos e precisos.

Rebecca, Donny e HZW lutavam no chão, protegendo Ian, que começava a recuperar sua força. Quando o Elementar avançou diretamente contra eles, T-35 voltou à forma de garoto e deslizou pelo chão, criando um escudo de energia que bloqueou o ataque.

— É só isso que você tem? — provocou ele, seus olhos azuis brilhando intensamente.

Querub ergueu uma barreira luminosa para proteger o grupo enquanto disparava raios de energia contra os soldados restantes. Diab, com suas lâminas sombrias, eliminava os inimigos restantes com uma precisão impressionante.

O Elementar rugiu, criando uma explosão de fogo que obrigou todos a recuar momentaneamente. Querub e Diab combinaram seus poderes, misturando luz e sombras em um ataque devastador que atingiu o Elementar diretamente, desequilibrando-o.

T-35 pousou ao lado de HZW, ainda sorrindo.

— Essa foi boa, mas acho que podemos melhorar.

HZW sorriu de volta, assentindo.

— Vamos terminar isso juntos mano.

Com Querub, Diab, T-35 e o resto do grupo lutando lado a lado, a batalha parecia equilibrada. Apesar do imenso poder do Elementar Primordial, a união e determinação deles trazia esperança de uma vitória. A luta estava longe de terminar, mas a esperança era real.

Enquanto a batalha parecia iminente, o Elementar Primordial se ergueu no centro da clareira, sua forma colossal composta de fogo e pedra irradiando uma energia avassaladora. Contudo, ao contrário do que todos esperavam, Querub e Diab permaneceram imóveis, seus olhares fixos no inimigo, sem qualquer traço de medo ou hesitação.

Rebecca levantou sua arma, pronta para o combate, mas foi interrompida por Diab, que ergueu uma mão e deu um passo à frente. Seus olhos vermelhos brilhavam intensamente enquanto ele encarava o Elementar Primordial.

— Por que você está fazendo isso? — perguntou Diab, sua voz firme, mas não agressiva. — Por que atacar estes que não têm culpa? Por que atacar nossos amigos?

O Elementar rugiu, sua voz ecoando como trovões pela floresta.

— Eu sigo minha essência. O equilíbrio foi perturbado, e agora o caos deve reinar. Esses mortais desafiam a ordem natural!

Querub deu um passo à frente ao lado de Diab, seu semblante calmo. Seus olhos azuis cintilaram, e ele falou com uma voz serena, mas cheia de autoridade.

— Você sabe que o equilíbrio não é alcançado com destruição. Somos testemunhas da ordem divina, e isso que você faz não está alinhado com nossa essência.

O Elementar hesitou por um momento, suas chamas tremulando, como se estivesse reconsiderando. Mas logo ergueu sua mão flamejante, mirando no grupo.

— Eles interferem! Eles resistem! E vocês... por que os protegem? Vocês são como eu, mas escolhem o lado errado.

Diab deu um passo à frente, aproximando-se ainda mais, suas sombras oscilando ao redor de seu corpo. 

— Nós escolhemos o lado certo. O lado que entende que equilíbrio é mais do que poder. É justiça. Eles não desafiam a ordem; eles a protegem contra o seu erro.

Querub estendeu uma mão para Rebecca, que ainda segurava sua arma com firmeza.

— Rebecca, abaixe sua arma. Ele não pode nos tocar. Ele é como nós.

Rebecca olhou para Querub, confusa, mas baixou a arma lentamente. T-35, ao seu lado, franziu o cenho, mas permaneceu atento.

Diab se virou brevemente para o grupo, sua expressão mais suave.

— Ele não pode nos ferir porque somos divinos. Mas ele pode ferir vocês, se não o fizermos entender. Isso não é sobre força, mas sobre propósito.

Querub deu um passo à frente e se aproximou do Elementar. Sua voz era firme, mas compassiva.

— Pare agora. Lembre-se do nosso propósito. Não se deixe consumir pelo caos. Você ainda pode escolher o equilíbrio.

O Elementar rugiu novamente, mas desta vez, suas chamas vacilaram, como se houvesse uma batalha interna acontecendo dentro dele. Seus olhos flamejantes se voltaram para Querub e Diab.

— Equilíbrio? — ele repetiu, sua voz menos furiosa. — Vocês acham que eles merecem equilíbrio?

Querub assentiu.

— Merecem. Assim como todos. O equilíbrio não é algo que impomos. É algo que cultivamos, com compreensão e justiça.

O Elementar parecia titubear, sua forma tremulando. Diab deu mais um passo à frente, seus olhos vermelhos fixos no inimigo.

— Você não é nosso inimigo. E eles também não são. Não continue por esse caminho errado.

O silêncio que se seguiu foi pesado. O Elementar Primordial abaixou sua mão flamejante, as chamas que o rodeavam diminuindo gradualmente. Sua voz ecoou pela clareira, agora menos ameaçadora. — Talvez... eu tenha perdido meu caminho.

Querub sorriu levemente, levitando e estendendo a mão para o Elementar.

— Todos podemos nos desviar. O importante é encontrar o caminho de volta.

Rebecca e os outros observavam em silêncio, perplexos com a interação. T-35 finalmente quebrou o silêncio, murmurando para HZW. 

— Querub e Diab são incríveis... Eles literalmente conversaram com um monstro.

HZW respondeu com um pequeno sorriso.

— Eles não o veem monstro. Só alguém perdido.

Enquanto o Elementar recuava, ainda lutando com seus próprios conflitos internos, Diab se virou para o grupo.

— Isso ainda não acabou. Mas ele não é mais nosso inimigo. Não hoje.

Querub assentiu.

— Agora, temos uma chance real de restaurar o equilíbrio. Juntos.

Enquanto o Elementar Primordial abaixava sua mão flamejante, as chamas que o envolviam diminuíram ainda mais. Querub, com seus olhos azuis brilhantes e expressão serena, deu mais um passo à frente, ficando face a face com a imponente criatura.

— Elementar — começou Querub, sua voz calma, mas carregada de autoridade —, você foi criado para proteger o equilíbrio, não para destruir. Mas as ações que tomou deixaram muitos sem defesa, vulneráveis. Se realmente busca justiça, deve corrigir isso.

O Elementar inclinou levemente a cabeça, como se considerasse as palavras de Querub.

— Corrigir? O que você quer de mim, Querub? A humanidade desafiou o equilíbrio. Eles se voltaram contra a ordem.

Querub respirou fundo, mantendo o tom firme, mas gentil.

— Humanos erram. Mas também aprendem, crescem, evoluem. Você retirou deles o que precisavam para se defender, deixando-os expostos. Se você realmente busca equilíbrio, devolva os poderes que tirou daqueles que ainda estão vivos.

O Elementar hesitou, sua forma oscilando enquanto uma chama fraca surgia em seus olhos. Diab, com seus cabelos ruivos e olhos vermelhos brilhantes, deu um passo ao lado de Querub.

— Ele está certo, Elementar.

Diab cruzou os braços, sua voz carregada de um misto de compaixão e severidade.

— Não podemos punir toda uma espécie por suas falhas. Não é assim que o equilíbrio funciona. Você quer justiça, mas a justiça não é crueldade.

O Elementar olhou para os dois, seus olhos flamejantes vacilando.

— E se eles falharem de novo? Se usarem seus dons para causar mais destruição?

Querub sorriu levemente, sua luz azul irradiando calma.

— Então, nós estaremos aqui para guiá-los. Assim como estamos aqui para você agora. A humanidade não está sozinha. Nem você está.

T-35, observando tudo, deu um passo à frente, sua voz carregada de esperança.

— Se eles tiverem seus poderes de volta, eles poderão lutar, proteger uns aos outros e buscar algo melhor. Não tire a chance deles de fazer o certo.

Rebecca, ao lado de HZW, murmurou, seus olhos fixos no Elementar. — Eles estão tentando. É isso que importa. Ninguém consegue equilíbrio se não tiver a oportunidade de se levantar.

O Elementar ficou em silêncio por um momento que pareceu uma eternidade. Suas chamas começaram a diminuir, tornando-se menos ameaçadoras. Ele finalmente ergueu a cabeça, olhando para Querub e Diab.

— Se eu concordar com isso, será por vocês. Não por eles. — Sua voz ecoava, menos furiosa e mais reflexiva.

— Vou devolver os dons que tomei. Mas, Querub, Diab... a responsabilidade será de vocês. Certifiquem-se de que eles não se desviem novamente.

Querub assentiu, seu sorriso se ampliando.

— Nós aceitamos essa responsabilidade. Sempre aceitamos.

O Elementar levantou ambas as mãos, e uma onda de energia poderosa irradiou de seu corpo. Um brilho dourado atravessou a floresta e o resto do mundo e se espalhou, como um vento que carregava vida. Rebecca, Donny, e até mesmo HZW e T-35 sentiram a energia fluir ao redor, como se o próprio mundo estivesse respirando novamente.

— Está feito — disse o Elementar, sua voz carregada de cansaço.

— Os que ainda vivem, agora têm seus dons de volta.

Rebecca olhou para Querub, seus olhos cheios de gratidão. — Obrigada. Isso significa tudo.

Querub apenas sorriu, enquanto Diab se aproximava do Elementar, seus olhos vermelhos ainda fixos nele.

— Você tomou a decisão certa. E nós faremos nossa parte.

O Elementar e seu exército flamejante recuou e suas formas começaram a se desvanecer como fumaça ao vento. Antes de desaparecer completamente, o Elementar lançou um último olhar para Querub e Diab.

— Não me decepcionem.

Quando ele se foi, a clareira ficou em silêncio por um momento. Então, Querub virou-se para o grupo, e com seus olhos azuis brilhando com determinação falou aos seus amigos:

— A humanidade tem uma segunda chance. Vamos garantir que eles a aproveitem.

T-35 virou-se para HZW e dando um abraço bem apertado disse:

Mano, eu te amo demais e seus poderes voltaram. Podemos brincar e voar juntos.

Uma lágrima escorreu dos olhos de HZW. 

CONTINUA...

Por Alcí Santos

NOVO!

HUSTLER - A ILHA - CAPÍTULO 10

Finalmente, ao amanhecer, o enigma se desvendou. Um compartimento secreto na pedra se abriu, revelando não ouro ou joias, mas uma essência l...